A Humanidade de Lara Croft | PARTE IX: A sombra da saqueadora
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Shadow of the Tomb Raider (2018)
Shadow of the Tomb Raider (2018)
Shadow of the Tomb Raider chegou em 2018 para concluir a trilogia reboot, sob a promessa de que Lara se tornaria a Saqueadora de Tumbas - Become the Tomb Raider é a frase de efeito do jogo. A princípio, poderíamos nos perguntar qual Saqueadora de Tumbas ela se tornaria: uma adaptação daquela Tomb Raider que conhecíamos ou uma versão completamente alheia. Se fosse a segunda opção, a promessa seria vazia, pois não daria para saber quem diabos Lara iria se tornar. Simplesmente a transformariam no que bem quisessem e depois chamariam o resultado final de Tomb Raider — era uma hipótese possível, haja vista a maneira da qual Lara foi representada nos jogos anteriores.
Acontece que Lara Croft começou a apresentar algumas atitudes que a distanciaram drasticamente de sua versão em Rise of the Tomb Raider.
Logo no início, ela se viu dentro de um templo em pleno desmoronamento, e precisou ser puxada por Jonah, pois não queria sair de lá.
Do lado de fora, ela disse que desejava ainda estar lá fotografando. Lara teve um determinado senso de humor em Shadow of the Tomb Raider, ela parecia animada com sua expedição.
Posteriormente, Croft conseguiu entrar em outro templo maia, e sua expressão foi de empolgação por ter achado um mural antigo. Aliás, a cada descoberta nesta história, ela esboçava entusiasmo. Nesse momento, lembro-me de uma citação do livro Tomb Raider O Culto Perdido, de quando Lady Croft encontrou — leia-se "roubou" — algumas tabuletas do antigo Império Romano: "A maravilha de sua textura alimentou a alma da Saqueadora de Tumbas". É isso que se espera de Lara Croft.
A história de Shadow foi bastante inspirada no quarto jogo da franquia, Tomb Raider The Last Revelation. Lara coletou um artefato que desencadeou uma série de cataclismos, e precisou correr contra o tempo para livrar o mundo da completa destruição. Ela reagiu com culpa após reconhecer seu erro. Essa cena deu uma certa angústia.
Lembremos que em The Last Revelation, Lara também se sentiu culpada. Em Shadow, no entanto, o dramático enredo providenciou uma imediata enchente naquela cidade, forçando Lara a presenciar todos morrerem por causa de sua insensatez.
Aqui, gostaria de observar uma diferença elementar entre esta Lara e a Lara clássica: a maneira com que reage a tragédias, e como lida com suas emoções. A Croft clássica era mais petulante. Embora ela admitisse seus erros, não saía por aí com expressão de pena. Talvez a raiva que ela sentisse de si mesma por ter cometido um grande erro se sobrepusesse ao sentimento de angústia, e seu autocontrole emocional dificilmente a faria gritar e discutir calorosamente (como a Lara "atual" fez com Jonah). Ao contrário, a Lara clássica descarregava suas emoções destruindo coisas, atirando em alvos com tantas armas quanto pudesse segurar ou pulando de um precipício de ponta cabeça. A adrenalina a mantinha alerta e sã.
Em compensação, a Lara de Shadow of the Tomb Raider pareceu mais dramática em suas reações. Quando numa situação de alta carga emocional, a angústia parecia ser maior do que outros sentimentos, embora fosse possível perceber algumas nuances de raiva.
Além disso, a maneira com que a Lara clássica se submetia voluntariamente a riscos tornaram-na uma pessoa que não esboçava medo por qualquer motivo. Ela já estava acostumada, inclusive era apaixonada pelo perigo — os jogos clássicos não eram capazes de inserir tantas sutilezas nas expressões de Lara, justamente pela falta de tecnologia; mas os livros são eficientes em descrever os arrepios que ela sentia quando presenciava determinadas situações. A Lara de Shadow também demonstrou estar no mesmo processo de construção da autoconfiança, como quando ela se viu em meio a jaguares e os olhou com expressão de braveza. Essa nuance da personalidade ocorreu frequentemente no jogo.
Quando fora de perigo, Lara assumia um temperamento meigo e respeitoso. Isso é demonstrado principalmente nos seus diálogos, alguns bastante descontraídos.
Mas em um determinado momento da história, Croft começou a agir com mais audácia. Ela chegou a tratar seus inimigos com arrogância, e o clímax mostrou a arqueóloga assassinando com legítimo ódio.
Após o ápice emocional de Lara, vem à tona o sentimento de culpa por ter submetido seu amigo Jonah a tamanho risco. Lara provavelmente achou que ele estivesse morto, e quando Jonah reaparece ela sente vergonha de si mesma — tanto que evita olhar para ele. Essas emoções, na verdade, fazem parte do principal conflito pessoal da personagem: durante o jogo ela frequentemente se questiona se está fazendo a coisa certa, e se vale a pena colocar tantas pessoas em risco. Como se não bastasse esse sofrimento, Lara ainda demonstra não ter superado totalmente a morte dos pais.
O conflito é resolvido ao final do jogo, quando Lara, através do poder da antiga adaga Maia, se despede simbolicamente dos seus pais e aceita o seu destino como ele é. É impossível assistir à cena da despedida sem sentir um "quentinho" no coração. A Saqueadora de Tumbas recordou doces memórias de sua infância e se viu diante daquilo que mais sonhava: viver com seus pais. Mas aceitou que a vida nem sempre é o que desejamos. Uma lição e tanto.
Shadow of the Tomb Raider é o jogo em que Lara possui mais nuances de personalidade dentro desta trilogia. Os sentimentos variaram entre alegria, empolgação, culpa, ódio, profundo afeto, vergonha, tristeza, cumplicidade, autoconfiança e compaixão. As sutilezas nas suas expressões e sentimentos, proporcionadas tanto pela trama quanto pela tecnologia, tornam a Lara de Shadow uma personagem completa, profunda e bastante consistente.
Expansões do jogo
Numa época em que as empresas de games superfaturam na base de DLC's, foram lançadas sete para Shadow of the Tomb Raider. Naturalmente, as histórias das DLC's são os momentos em que Lara está mais "evoluída" desde o jogo de 2013, e é nelas que boa parte do Become the Tomb Raider acontece — era de se esperar que acontecesse majoritariamente na campanha principal, mas as DLC's foram mais eficientes na representação de Lara como a Tomb Raider que ela estava destinada a ser. Após todas as lições aprendidas durante a trilogia, Lara assume uma postura mais audaciosa, que é demonstrada nas suas atitudes, como também nas suas expressões faciais e corporais. A última DLC termina com Lara apresentando um trejeito bastante reconhecível pelos fãs de longa data da arqueóloga:
Ainda faltava bastante para se tornar aquela Saqueadora de Tumbas, mas reconheçamos que o Become the Tomb Raider não foi uma promessa totalmente vazia, afinal.
Clique aqui para ler a última parte desta série.
Acontece que Lara Croft começou a apresentar algumas atitudes que a distanciaram drasticamente de sua versão em Rise of the Tomb Raider.
Logo no início, ela se viu dentro de um templo em pleno desmoronamento, e precisou ser puxada por Jonah, pois não queria sair de lá.
NÃO! Eu tenho que fotografar isso! |
Posteriormente, Croft conseguiu entrar em outro templo maia, e sua expressão foi de empolgação por ter achado um mural antigo. Aliás, a cada descoberta nesta história, ela esboçava entusiasmo. Nesse momento, lembro-me de uma citação do livro Tomb Raider O Culto Perdido, de quando Lady Croft encontrou — leia-se "roubou" — algumas tabuletas do antigo Império Romano: "A maravilha de sua textura alimentou a alma da Saqueadora de Tumbas". É isso que se espera de Lara Croft.
A história de Shadow foi bastante inspirada no quarto jogo da franquia, Tomb Raider The Last Revelation. Lara coletou um artefato que desencadeou uma série de cataclismos, e precisou correr contra o tempo para livrar o mundo da completa destruição. Ela reagiu com culpa após reconhecer seu erro. Essa cena deu uma certa angústia.
Lembremos que em The Last Revelation, Lara também se sentiu culpada. Em Shadow, no entanto, o dramático enredo providenciou uma imediata enchente naquela cidade, forçando Lara a presenciar todos morrerem por causa de sua insensatez.
Arrependimento e angústia. |
Em compensação, a Lara de Shadow of the Tomb Raider pareceu mais dramática em suas reações. Quando numa situação de alta carga emocional, a angústia parecia ser maior do que outros sentimentos, embora fosse possível perceber algumas nuances de raiva.
Além disso, a maneira com que a Lara clássica se submetia voluntariamente a riscos tornaram-na uma pessoa que não esboçava medo por qualquer motivo. Ela já estava acostumada, inclusive era apaixonada pelo perigo — os jogos clássicos não eram capazes de inserir tantas sutilezas nas expressões de Lara, justamente pela falta de tecnologia; mas os livros são eficientes em descrever os arrepios que ela sentia quando presenciava determinadas situações. A Lara de Shadow também demonstrou estar no mesmo processo de construção da autoconfiança, como quando ela se viu em meio a jaguares e os olhou com expressão de braveza. Essa nuance da personalidade ocorreu frequentemente no jogo.
Quando fora de perigo, Lara assumia um temperamento meigo e respeitoso. Isso é demonstrado principalmente nos seus diálogos, alguns bastante descontraídos.
Mas em um determinado momento da história, Croft começou a agir com mais audácia. Ela chegou a tratar seus inimigos com arrogância, e o clímax mostrou a arqueóloga assassinando com legítimo ódio.
"Não ouse", diz Lara, sem paciência, a um homem que a ameaça. |
Após o ápice emocional de Lara, vem à tona o sentimento de culpa por ter submetido seu amigo Jonah a tamanho risco. Lara provavelmente achou que ele estivesse morto, e quando Jonah reaparece ela sente vergonha de si mesma — tanto que evita olhar para ele. Essas emoções, na verdade, fazem parte do principal conflito pessoal da personagem: durante o jogo ela frequentemente se questiona se está fazendo a coisa certa, e se vale a pena colocar tantas pessoas em risco. Como se não bastasse esse sofrimento, Lara ainda demonstra não ter superado totalmente a morte dos pais.
O conflito é resolvido ao final do jogo, quando Lara, através do poder da antiga adaga Maia, se despede simbolicamente dos seus pais e aceita o seu destino como ele é. É impossível assistir à cena da despedida sem sentir um "quentinho" no coração. A Saqueadora de Tumbas recordou doces memórias de sua infância e se viu diante daquilo que mais sonhava: viver com seus pais. Mas aceitou que a vida nem sempre é o que desejamos. Uma lição e tanto.
Shadow of the Tomb Raider é o jogo em que Lara possui mais nuances de personalidade dentro desta trilogia. Os sentimentos variaram entre alegria, empolgação, culpa, ódio, profundo afeto, vergonha, tristeza, cumplicidade, autoconfiança e compaixão. As sutilezas nas suas expressões e sentimentos, proporcionadas tanto pela trama quanto pela tecnologia, tornam a Lara de Shadow uma personagem completa, profunda e bastante consistente.
Expansões do jogo
Numa época em que as empresas de games superfaturam na base de DLC's, foram lançadas sete para Shadow of the Tomb Raider. Naturalmente, as histórias das DLC's são os momentos em que Lara está mais "evoluída" desde o jogo de 2013, e é nelas que boa parte do Become the Tomb Raider acontece — era de se esperar que acontecesse majoritariamente na campanha principal, mas as DLC's foram mais eficientes na representação de Lara como a Tomb Raider que ela estava destinada a ser. Após todas as lições aprendidas durante a trilogia, Lara assume uma postura mais audaciosa, que é demonstrada nas suas atitudes, como também nas suas expressões faciais e corporais. A última DLC termina com Lara apresentando um trejeito bastante reconhecível pelos fãs de longa data da arqueóloga:
Ainda faltava bastante para se tornar aquela Saqueadora de Tumbas, mas reconheçamos que o Become the Tomb Raider não foi uma promessa totalmente vazia, afinal.
Clique aqui para ler a última parte desta série.
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